Muito das informações acerca das relações farmacocinéticas-farmacodinâmicas nos canabinóides(especialmente do Δ 9 –THC) é derivada de estudos sobre uso recreacional de cannabis ao invés de estudos sobre uso terapêutico, mas de qualquer forma, essa relação depende, em certo grau, do momento no tempo em que essa observação foi feita após a administração do canabinóide. Ademais, a relação temporal entre as concentrações plasmáticas de Δ 9 –THC e os efeitos clínicos, terapêuticos, psicotrópicos e cognitivos não foi bem estabelecida. Esses efeitos geralmente ficam pra tras em relação às concentrações plasmáticas de Δ 9 –THC, e é sabido acerca do desenvolvimento de tolerância em relação à alguns efeitos, mas não em outros (101,151,330), veja também (187) e a seção 2.4 (tolerância e dependência)
Como mencionado acima, a relaçao entre dose(e concentrações plasmáticas) versus resposta para possíveis aplicações terapêuticas são mal definidas, exceto por alguma informação obtida acerca da dosagem oral com dronabinol (Δ 9 –THC sintético, conhecido no mercado como Marinol), nabiximol (um extrato botânico de cannabis contendo aproximadamente a mesma concentração de Δ 9 –THC e CBD como também outros canabinóides, terpenóides ou flavonóides, com nome comercial de Sativex ), ou nabilone (Δ 9 –THC sintético, análogo com nome comercial de Cesamet) devido às suas indicações limitadas (174,290,332). Interpretações da farmacocinética do Δ 9 –THC são também complicadas pela presença de metabólitos ativos, particularmente o psicoativo 11-hidroxi THC, que são encontrados em maiores concentrações após a administração oral em comparação à inalação (286, 327).
Concentrações-alvo no plasma de Δ 9 –THC foram derivadas baseadas no sintoma subjetivo de ‘’barato’’, esta resposta pode ou não ser relacionada às potenciais aplicações terapêuticas . Diversos modelos farmacodinâmicos nos dão estimativas de concentração plasmática na variação de 7-29 ng/mL de Δ 9 –THC. Essas estimativas referem-se aos valores necessários para produzir 50% da sensação subjetiva de ‘’barato’’. (330) Outros estudos sugerem que a concentração plasmática de Δ 9 –THC relacionada à essa sensação(50%) variam entre 2 e 250 ng/mL de (mediana de 19ng;mL media de 43/mL de Δ 9 –THC) para cannabis fumada ou por via I.V, enquanto que na via oral os valores variam entre 1 e 8ng/mL (mediana e média de 5ng/mL de Δ 9 –THC) (111,333). Concentrações no soro entre 7 e 10ng/Ml (no sangue inteiro, aproximadamente 3-5 ng/mL) foram comparadas com as concentrações de alcoolemia de 0.05%, que já é uma concentração relacionada com diminuição da habilidade no volante (133)
Cannabis Fumada
Simulações de múltiplas dosagens usando um cigarro de 1% de concentração de THC contendo 9mg de mg Δ 9 –THC relacionaram-se com um efeito de’’barato’’ durando aproximadamente 45 minutos após a dosagem inicial, diminuindo para 50% do pico em cerca de 100 minutos após o fumo (151). Um intervalo de dosagem de 1h com essa dose renderia um efeito de ‘’barato’’ continuo, e o tempo de recuperação após a útima dose seria de 150min (2h e meia). O pico da concentração de mg Δ 9 –THC plasmático durante essa dosagem é estimado em torno de 70ng/mL
Um estudo clínico reportou um aumento na frequência e uma sensação boa no paciente dentro de 7 minutos após o paciente fumou um cigarro com 1g de cannabis contendo uma concentração de 1.8% ou de 3.9% (doses médias de Δ 9 –THC sendo 18mg ou 39 mg, respectivamente) (129). Comparado com o placebo, ambas as doses renderam diferenças estatisticamente significantes nas medições subjetivas e nos efeitos fisiológicos; a dose maior agiu diferente da dose menor no que diz respeito aos efeitos subjetivos, mas não aos efeitos fisiológicos como frequência cardíaca. Modelação farmacocinética-farmacodinâmica da relação concentração/efeito de Δ 9 –THC nos parâmetros do Sistema Nervoso Central ou da frequência cardíaca sugerem que os efeitos gerados pelo THC geralmente são atrasados em relação à concentração plasmática de THC, com os efeitos durando significantemente maior do que a concentração plasmática de Δ 9 –THC (334). As estimativas acerca da relação meia vida/frequência cardíaca foram de cerca de 7 minutos, mas variaram entre 39 e 85 minutos para diversos parâmetros do Sistema Nervoso Central (334). De acordo com esse modelo, os efeitos no Sistema Nervoso Central desenvolveram-se de maneira mais devagar e duraram mais do que o efeito na frequência cardíaca.
A performance psicomotra e os efeitos subjetivos e fisiológicos associados com os níveis sanguíneos de Δ9 –THC em pacientes fumantes pesados e crônicos de cannabis após um episódio de uso do cigarro foram analisados. (280). Pacientes estudados reportaram fumar uma média de 1 ‘’baseado’’ por dia nos ultimos 14 dias antes do início do estudo (média 0.7 – 12 cigarros por dia ) (280). Durante o estudo, os pacientes estudados fumaram um cigarro de cannabis (peso médio 0.79± 0.16g) contendo 6.8±0.2% de THC, 0.25±0.08 CBD e 0.21±0.02% de CBN, rendendo uma média total de THC, CBD e CBN de 54, 2.0 e 1.7mg desses canabinóides por cigarro (280). A concentração de pico média de THC no sangue e o pico nas escalas analógicas de sintomas subjetivos foram ambas analisadas 15 min após o início do ato de fumar (280). De acordo com os autores do estudo, a relação farmacocinética-farmacodinâmica foi descrita como uma histerese antihorária (ou seja, pela mesma concentração plasmática de uma droga, o efeito farmacológico é maior em um intervalo maior de tempo, e não menor) para todos os efeitos analisados (barato, estimulação, sedação, ansiedade). Essa relação bastante particular demonstra uma falta de correlação entre as concentrações sanguíneas de THC e os efeitos observados, iniciando imediatamente após o fim do fumo e continuando durante a distribuição inicial e nas fases de eliminação (280). Todos os pacientes reportaram um pico na sensação de ‘’barato’’ entre 66 e 85 na escala visual analógica, com uma concentração de pico no sangue de THC no momento dessas impressões variando entre 13-63 ng/mL (280). Seguindo o início do fumo da cannabis, a frequência cardíaca elevou-se significantemente aos 30 minutos, a pressão arterial diastólica diminuiu significantemente no período entre 30min e 1h e a pressão sistólica e a frequência respiratória manteram-se estáveis (280)
Canabinóides orais e oro-mucosais
Os efeitos fisiológicos e subjetivos após a administração controlada de nabiximol (Sativex) ou THC oral foram comparados (107). Aumento na pressão arterial sistólica ocorreram com doses baixas (5m) e altas (15mg) de THC oral, como também com doses baixas de nabiximol (5.4mg de Δ 9 –THC e 5mg CBD) e altas (16.2mg Δ 9 –THC e 15mg CBD), com o pico de efeito em torno de 3h após a administração (107). Em contraste, a pressão arterial diastólica diminuiu entre 4 e 8 horas após a dosagem. A frequência cardáica aumentou após todos os tratamentos. Esse aumento da frequência cardíaca em relação ao placebo foi observado após altas doses orais de THC (15mg de Δ 9 –THC) e altas doses de nabiximol (16.2mg Δ 9 –THC e 15 mg CBD), mas os autores indicaram que os aumentos pareceram menos cilinicamente significantes do que aqueles vistos tipicamente na cannabis fumada (107). Altas doses orais de THC (15mg Δ 9 –THC) e altas doses de nabiximol (16.2mg Δ 9 –THC e 15 mg CBD) foram associados com um maior efeito de ‘’sentir-se bem’’ em comparação ao placebo, enquanto doses baixas de nabiximol (5.4mg Δ 9 –THC e 5mg de CBD) foram associados com efeitos bem maiores de ‘’sentir-se bem’ comparado com 5mg de THC (107). Um efeito subjetivo de ‘’barato’’ foi reportado como sendo muito maior após 15mg via oral de THC comparado com o placebo e com 5mg de THC oral. Em contraste, nem a dose alta ou baixa de nabiximol produziram diferenças no sentimento de ‘’barato’’. Os pacientes estudados reportaram uma sensação de ansiedade maior em aproximadamente 4 horas após a administração de 5mg de THC oral, 3h após 15mg de THC oral, 5.5h após doses baixas de nabiximol e 4.5h após doses altas de nabiximol (107). Todo tratamento ativo utilizando essas drogas induziram mais ansiedade em relação ao placebo. Após 15mg de THC oral, a concentração de THC no plasma foi definida como tendo uma fraca, mas estatisticamente relevante, correlação positiva com a pressão sistolica e diastólica, o efeito de ‘’sentir-se bem’’ e o ‘’barato’’ (107). Após doses altas de nabiximol, correlações positivas entre THC no plasma e os efeitos citados acima foram observadas. (107). Consistente com outros estudos, os autores desse estudo reportaram que correlações lineares entre concentrações de THC e efeitos fisiológicos e subjetivos eram fracas.Finalmente, apesar do cannabidiol não apresentar um efeito modulador significante no THC, o autor sugere que pode ter atenuado um pouco o grau de ‘’barato’’ subjetivo (107)